“Se no passado a economia condicionou a utilização do meio ambiente, sem se preocupar com a degradação e exaustão de seus recursos, atualmente parece ser o meio ambiente que deve condicionar a economia” (Comune, 1994, p. 45-46).

Pesquisar este blog

XI Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica

XI Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica
XI Encontro Nacional da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica (ECOECO) e VII Congreso Iberoamericano de Desarrollo y Ambiente (CISDA) 2015 "Aplicações da Economia Ecológica nas Políticas Públicas Latino-americanas"

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Desigualdade, pobreza e os mais pobres

Artigo publicado na Gazeta do Povo, caderno de opinião, 19 de fevereiro de 2014

Por Junior Garcia

O Relatório das Nações Unidas (ONU), Humanidade dividida: confrontando a desigualdade nos países em desenvolvimento, mostra que 1% da população mais rica concentra mais de 40% da riqueza global, e que mais da metade da população pobre detém apenas 1%. Os dados do Banco Mundial mostram que 20,6% da população mundial estava em situação de pobreza em 2010, representa 1,2 bilhões de pessoas. Essa realidade é reflexo da manutenção da desigualdade e da população pobre no mundo.

Neste contexto, desigualdade e pobreza têm sido discutidos como importantes problemas globais a serem enfrentados, ocupando, por exemplo, o centro da agenda de discussões do Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos, Suíça. O interessante é que a solução proposta por governos e órgãos multilterais é a mesma, crescimento econômico.

Existe sim uma relação entre desigualdade, pobreza e crescimento econômico, mas esta não é determinística. Em determinadas situações apenas o crescimento econômico não é suficiente. Isso ocorre porque desigualdade diz respeito à distribuição da renda, da riqueza ou dos benefícios do crescimento entre a população. Por sua vez, a pobreza corresponde a carência absoluta ou relativa de recursos para que a população tenha acesso aos meios para uma vida saudável, que não inclui apenas alimentação adequada, mas também mordia, educação, saúde, cultura etc.

O Relatório da ONU mostra ainda que a desigualdade de renda aumentou entre 1990 e 2010, embora a economia global tenha crescido. Isto significa que o crescimento não contribuiu para a redução da desigualdade de renda ou mesmo da situação de pobreza. Por conseguinte, o crescimento econômico ainda pode ser a solução? Recorde que o crescimento, no contexto atual, contribui para elevar o grau de degradação dos ecossistemas, seja na extração de recursos naturais seja no aumento da poluição.

Na verdade, a redução da desigualdade e da situação de pobreza demanda outros instrumentos, ou meios. Para reduzir a desigualdade, os governos deveriam implementar políticas de redistribuição da renda e da riqueza não restritos apenas aos programas de transferência direta como o Bolsa Família que afetam apenas a situação de pobreza, mas, por exemplo, adotar impostos sobre a renda e a riqueza progressivos, reduzir impostos sobre o consumo de bens básicos e elevar a tributação sobre bens posicionais e de luxo. O problema é que os 1% ou 10% mais ricos são contrários, embora eles reconheçam que a situação de pobreza seja um importante problema a ser enfrentado, pelo menos no discurso. Para os mais ricos o que incomoda não é a desigualdade na distribuição de renda e da riqueza, mas a situação de pobreza das pessoas.

Neste sentido, o apoio dos mais ricos se restringe a ações de curto prazo, filantrópicas, como doações, campanhas de arrecadação de alimentos etc., que apenas aliviarão a situação de pobreza momentânea da população, sem enfrentar realmente as questões estruturais, tais como reduzir o imenso abismo entre os rendimentos, responsável tanto pela desigualdade como pela situação de pobreza. A solução passa por uma mudança cultural e de valores, que implica na aceitação de que pessoas com baixa qualificação relativa também tenham o direito a um salário digno. É justo que 30 milhões de brasileiros tenham renda média per capita de R$ 139,58? Essa proposta implica que os mais ricos repartam sua "fatia do bolo", será que eles estão dispostos?

domingo, 17 de maio de 2015

Até quando estará disponível a saída via crescimento?

Artigo publicado na Gazeta do Povo, caderno de opinião, 24 de fevereiro de 2013.

Por Junior Garcia

A década de 1970 inaugurou uma "nova fase" do capitalismo, caracterizada pela recorrência de crises. Neste período o capitalismo aportou à sociedade um conjunto quase que simultâneo de crises. Já passamos por crises energéticas, externas, da dívida, financeiras, imobiliárias, mobiliárias, de alimentos e socioculturais. Ainda, a sociedade passou a conviver com uma crise ecológica. Essa visão foi reforçada pelo relatório do Fórum Econômico Mundial, Riscos Globais 2013, alertando sobre o aumento da probabilidade de ocorrência de novos desequilíbrios.
A crise ecológica se mostra como o grande desafio para a sociedade, uma vez que seus efeitos e suas soluções não estão restritos as ações de uma única nação. As inúmeras conferências ambientais são prova de tal desafio, onde nunca há um consenso. A crise ecológica, a elevação dos preços de gêneros alimentícios e a crise econômico-financeira iniciada em 2008 trouxeram a tona um debate que é tratado como um tabu pelos economistas, o limite absoluto imposto pelos ecossistemas ao crescimento econômico perpétuo.
A economia é sustentada pelo constante aumento da produção, não pelo aumento de bem-estar. Mas a base energética e material que sustenta a economia é limitada pela disponibilidade de recursos naturais usados como fonte de insumos ou como depósito de resíduos. Assim, os limites biofísicos do Planeta colocam uma barreira intransponível à expansão perpétua da economia, embora os modelos econômicos adotados pelos governos não incorporem essa perspectiva. Desse modo, o uso do crescimento econômico como uma saída para as crises, para a busca do sonhado "Pibão" ou para o também "sonhado" desenvolvimento dos países pobres talvez não esteja mais disponível.
Essa perspectiva tem sido sinalizada nas conferências ambientais, até reconhecida por alguns governos, mas infelizmente não tem sido incorporada nas decisões e nos modelos econômicos, nem ensinada nas escolas de economia. Ainda, a história tem mostrado que o crescimento não é suficiente para tornar uma sociedade desenvolvida ou mesmo para elevar o seu grau de bem-estar. O "bolo" já estragou. E a recente crise econômico-financeira revelou que os "remédios" prescritos no passado não têm surtido efeito. Talvez até "mate o paciente".
A insistência na busca pelo "Pibão" a qualquer custo tem contribuído apenas para agravar a crise socioecológica, sem efeitos práticos sobre o bem-estar. Por exemplo, os efeitos da redução do IPI para os automóveis quase não afetaram o produto da economia, mas aumentou os congestionamentos, o consumo de combustíveis e as emissões de gases de efeito estufa, sem contar os gastos com saúde.
Neste contexto, qual deve ser a alternativa para a economia brasileira que leve em conta as restrições biofísicas do sistema natural? Quais elementos deveriam compor um modelo econômico-ecológico? A resposta a essas questões passa por uma reformulação dos modelos econômicos que hoje não incorporam a variável ecológica. Além disso, os formuladores de política precisam empreender o aprofundamento de ações efetivamente de longo prazo, que visem incorporar os pressupostos do Desenvolvimento Sustentável, e não apenas a adoção de medidas paliativas de curto prazo baseadas em modelos equivocados. Caso contrário, os custos socioeconômicos seguirão aumentando, porque não existe "almoço grátis".